Arquivos de sites

O Grupo Afilhado

 

          O Chefe Lucas Meister se muda de Triunfo para Caibaté, uma cidade na região das Missões Jesuíticas no Rio Grande do Sul, noroeste do estado, e distante mais de 450 km de Triunfo, em 2008. Acaba a dupla Dabil-Lucas, formada pelo próprio e pelo chefe Daniel de Souza Franco, iniciada quando ainda eram escoteiros há mais de dez anos, chegando até a chefia juntos e incluindo a participação no Jamboree Mundial da Inglaterra em 2007.

 

A dupla Lucas-Dabil

 

          Foi uma grande perda para o Chama Farroupilha, além do amor de todos, também era muito competente nas suas funções e já era uma pessoa folclórica no grupo. Há muitas histórias do retratista oficial que carregava um tripé para bater fotos com a máquina digital (até para a Inglaterra), da canção suco suco suco, da expressão “ô, cara!”, dos muitos romances com as chefes de outros grupos e tantas outras histórias que o Lucas protagonizou e que são impublicáveis.

          Chegou a notícia em Triunfo de que estaria fundando um grupo escoteiro em sua nova cidade, logo buscamos contato e a informação se confirma. Realmente avançava na idéia da fundação de um grupo em Caibaté, mobilizando pessoas, visitando escolas uniformizado e explanando sobre o movimento. Não aguentava a saudade de praticar escotismo, mesmo que houvesse se mudado há poucos meses.

          Pessoalmente, precisamos dizer que nada traz mais alegria. Você ver alguém que foi seu escoteiro e chefe contigo enfrentar este desafio é gratificante, pois mostra que todo o trabalho dispensado frutificou, tivemos a feliz sensação da colheita após o plantio. É como ver um filho se formar e ingressar na vida profissional.

          Incondicionalmente todos do Chama Farroupilha apoiaram o projeto com as facilidades da internet e telefonia celular. Mantivemos um contato quase diário durante meses, transferindo material, idéias e atendendo as solicitações do Lucas Meister.

          Naturalmente, e depois oficialmente, o Chama Farroupilha se tornou padrinho deste novo grupo que chama-se “Caiboathe 335 RS”, obedecendo a grafia antiga e a pronuncia indígena. O lenço foi desenhado pelo então pioneiro Elvis Sarmento Silva e o Brasão pelo chefe Dabil, inspirados no brasão e cores do município. Também participamos muito palpitando o nome, para ajudar a comunidade local. Com o objetivo de homenagear o Chama Farroupilha, Lucas escolhe como data de fundação do Grupo Escoteiro Caiboathe a mesma data do Chama Farroupilha, 1º. de maio.

          Organizamos uma grande excursão para realizar a cerimônia de fundação e levamos praticamente todo o grupo. Saímos de Triunfo na sexta-feira, 30 de abril de 2010, próximo das 23 horas e viajamos em um ônibus muito confortável durante toda a noite, enfrentando uma cerração muito espessa. Ao clarear do dia estávamos em Caibaté, onde acampamos em um educandário no centro da cidade, que abriga o grupo escoteiro. A noite, realizamos o cerimonial de fundação do grupo que foi inteiramente concebido por nós e desenvolvido pelo Chama Farroupilha, iniciando com a troca de lenço do Chefe Lucas. Havia muitas autoridades locais presentes, o Comissário Distrital, chefe Alberto Stochero e a atual Conselheira do Conselho de Administração Nacional, Cristine Bohrer Ritt.

          Para proteger e abençoar o novo grupo, por sugestão do Chefe José Carlos Krause Lopes, oferecemos uma imagem de São Jorge, padroeiro do escotismo. Recebemos de presente uma elegante placa de agradecimento de nossos afilhados, que está orgulhosamente exposta em nosso armário de troféus.

 

 

Parte dos escoteiros presentes a fundação do Caiboathe, no dia seguinte da cerimônia

 

          Aproveitamos a viagem para conhecer o Santuário dos Três Mártires no Caaró, local de peregrinação católica, o município de Mato Queimado, onde fomos recebidos pelo prefeito municipal e as ruínas da Redução Jesuítica de São Miguel Arcanjo, em São Miguel das Missões, patrimônio mundial pela UNESCO, desde 1983.

 

 

 

Grupo Escoteiro Chama Farroupilha visitando as ruínas das Missões Jesuíticas em 2010.

 

Totens, uma antiga tradição esquecida

Totens

           Esta é uma tradição muito antiga no escotismo, parte da mística escoteira que vemos citada quando chefes mais idosos são mencionados e que atualmente está em desuso. Por isso que Benjamin Sodré era chamado Velho Lobo, Glaucus Saraiva era conhecido por Uirapuru, Jarbas Pinto Ribeiro era Quati e tantos outros.  Além da tradição passada de ouvido a ouvido, existe uma base documental, o livro Sempre a Direito, publicado em Portugal pela Editora Educação Nacional, escrito por Léopold Derbaix, com citações do próprio Baden-Powell. No capítulo “Os Tótemes”, páginas 298 e 299, o autor faz a seguinte explanação que está transcrita na forma original, sem mudanças no idioma ou estilo:

“Cada escoteiro terá, igualmente, o seu nome de guerra: o seu tóteme. Eis aqui uma inovação que muita gente critica e que, pelo contrário, revela a admirável sagacidade pedagógica de Baden-Powell. A mania das alcunhas e dos sobrenomes constitui um fato inegável, quer na caserna, quer nos colégios. Em vez de um nome puramente convencional, quase todos preferem designar os indivíduos por uma expressão incisiva ou maliciosa, nem sempre inocente, através da qual ressaltem os seus pontos fracos ou seus defeitos. Baden-Powell aproveita esta mania, que sabe perfeitamente ser impossível de combater; não só a torna inofensiva, mas tira dela todo o partido possível, utilizando-a com uma finalidade educativa. Ele gosta que se dê um nome de guerra a cada escuta, o nome de qualquer animal que possua um sinal característico da personalidade do interessado e que lhe recorde uma qualidade que lhe falta ou um defeito que ele deve combater.”

Capa do Livro Sempre a Direito

 

          Nos grupos escoteiros brasileiros que adotavam esta mística, a prática costumava ser que cada membro ao entrar para o grupo, mesmo que lobinho, escolheria um animal para ser chamado e servir de alcunha. Ao mesmo tempo, também poderia escrever uma pesquisa sobre o referido animal, descrevendo seus hábitos e características. Não era recomendado que fossem nomes de patrulhas do grupo nem totens que estivessem sendo usados por outros jovens naquele momento, para evitar confusões. Os que voltavam a ser usados em outros tempos recebiam números em romanos, tipo Jacaré II, Panda III.

          A prática desta tradição revela situações inusitadas promovidas pelos jovens que valem alguns relatos. Muitos destes totens acabam virando apelido de rua dos jovens, especialmente em lugares onde estes têm convivência também fora do grupo escoteiro. O inverso também ocorre com o apelido da rua virando o totem, quando já era um nome de animal. Outras vezes, o totem se estende para o seu irmão mais moço, que fica conhecido pelo diminutivo, algo tipo o coruja e o corujinha. Por vezes o escoteiro escolhe um totem e os outros acabam adequando o novo apelido, como o menino que escolheu pastor alemão, mas dada a sua personalidade, o totem foi adaptado para cachorro louco.

          Enfim, esta prática antiga é muito interessante e pode se tornar uma boa ferramenta para evitar o bullying, uma vez que o próprio escoteiro escolhe o apelido, evitando situações jocosas ou pejorativas. Particularmente, a empregamos em nosso grupo escoteiro com sucesso até os dias de hoje, onde todos, inclusive os chefes, tem seu totem.

As excursões de Georg Black.

As excursões de Georg Black.

          Nascido em 24 de abril de 1877, em Munique, Georg Black era professor de ginástica, havendo estudado na Escola Central Bávara para Instrutores de Ginástica, onde se diplomou. Em 1902 imigrou para o Brasil, dirigindo-se para o interior do Rio Grande do Sul, de onde acabou retornando e fixando-se em Porto Alegre, e como professor certificado acabou associando-se a Sociedade de Ginástica (Turnerbund). Trabalhou em diversas escolas e foi jogador de um clube local, que segundo relatos, teria sido o autor do primeiro gol de cabeça em uma partida de futebol no Rio Grande do Sul, causando a interrupção do jogo para discussão de sua validade. Em 1913 fundou o primeiro grupo escoteiro do Rio Grande do Sul, atualmente o grupo escoteiro mais antigo do Brasil em atividade. Celeiro de grandes lideranças do escotismo brasileiro, tal como a família Schiefferdecker, o Grupo Escoteiro Georg Black é orgulho de todos os escoteiros.

          Georg Black faleceu em 15 de maio de 1949, portanto com 72 anos. Em 1963, o grupo escoteiro 01 RS passou a se chamar Georg Black, em homenagem ao seu fundador. Naquele tempo da fundação, as atividades envolviam longas jornadas, com muitos dias de duração e com deslocamentos superiores a 20 km por dia a pé. O próprio Georg Black liderava e preparava minuciosamente estes eventos.

         Dessa época, temos cinco fotografias que fazem parte dos Arquivos Roth deste blog, portanto pertenciam a Ernesto Roth (1926-2006), mas que pela sua relevância, mereciam um post separado e destacado. Não sabemos mais a época exata em que foram realizadas nem o destino desta excursão ou sequer outros detalhes, exceto o que as fotos por si só descrevem, outras informações se perderam no tempo.

         Em todas se observa um contingente razoável de escoteiros. Na primeira das fotos aparece a Igreja Luterana São Luís, de Santa Cruz do Sul. Este templo foi concluído em 1924, portanto a atividade só pode ser posterior a esta data. Próximo a residência que aparece a esquerda da foto, a frente da tropa com um uniforme claro e parcialmente curvado, há uma figura semelhante a Georg Black, especialmente se comparado as demais fotos a seguir, mas difícil de ser confirmado devido à distância e qualidade da imagem.

          Em duas outras, a imagem característica de Georg Black é facilmente identificável, particularmente a longa e pontuda barba, o tom escuro dos cabelos e o formato do rosto. Por isso ampliamos digitalmente estes detalhes. Ambas foram tiradas em áreas urbanas, mas que não podemos precisar onde. Sabe-se que estas jornadas costumavam passar por várias cidades.

 

Nesta foto, aparece bem a direita, na primeira linha de formação, portanto a mais distante, sendo o primeiro, com o uniforme mais claro. Este detalhe ampliado pode ser visto abaixo:

 

 

Aqui, aparece na primeira linha de escoteiros, logo atrás da bandinha que abre o que parece ser um desfile. É a quarta pessoa, da esquerda para a direita, usando o mesmo uniforme mais claro. A ampliação digital desta área esta abaixo:

          Na quarta foto, há uma cena de acampamento, com fogueira montada no centro e bandeira hasteada.

          A quinta foto mostra a tropa com pessoas usando fantasias ao centro e outros com trajes típicos tiroleses. É descrito que nessa época o grupo escoteiro realizava fogos-de-conselho comunitários, para as pessoas da comunidade, com encenações teatrais. A foto foi tirada de dia e isto é apenas uma suposição. Todavia, os dois meninos que aparecem destacados atrás e sobre as pessoas fantasiadas também mereceram uma ampliação. As camisetas que usam estampam a logo do Grupo Escoteiro Georg Black, marca registrada deste grupo. Se havia dúvida que este desenho tenha sido adotado pelo próprio Georg Black, esta imagem deve ajudar a esclarecer o assunto.

 

Observem a estampa ampliada das camisetas dos meninos na última fila, por sobre os outros.

Marca registrada do GE Georg Black estampada nas camisetas.

          Comentários e observações sobre estas fotos são muito desejadas, pois acreditamos se tratar de um registro raro do escotismo brasileiro que ainda pode ser muito enriquecido.